sexta-feira, 3 de junho de 2011

No começo

No começo as emoções são mais intensas; o primeiro beijo, a ansiedade, a espera por uma ligação, as dúvidas. Então vem as primeiras dificuldades: a insegurança, o ciúme; mas também vem aquelas bobagens de coração fraco: a primeira vês que se pega na mão, os lugares marcantes e as primeiras boas memórias: o primeiro filme, os primeiros presentes, as datas comemorativas, as declarações de amor corajosas e envergonhadas, as mensagens de texto inesperadas, as ligações de madrugada.
No começo é tudo bonito, até o desespero é bonito, as noites em claro, a espera por uma reconciliação. No começo as brigas duram quinze minutos e são caladas por beijos inebriantes e pedidos de desculpas; até a saudade é acompanhada por um sorriso.
Com o tempo, as coisas se apaziguam, se estabilizam e o gráfico deixa de fazer ondas e passa apenas a subir. O companheirismo cresce, aparece a sensação de que se tem alguém com quem contar para tudo, pelo resto da vida. Estabelece-se confiança, credibilidade, amizade; as declarações de amor passam a ser extensas e perturbadoras, as palavras dóceis, as lagrimas emocionadas, as férias fantásticas e a sensação confortável de não precisar de mais nada. Tudo parece perfeito, comer um cachorro quente num sábado à noite é um programa insubstituível, olhar a programação da TV no domingo à noite é imprescindível, passar as tardes jogando conversa fora, então, nem se fala! Nada é rotina, nada é tedioso. Alguns chegam a pensar, até mesmo, imaginem só, em casamento!
E então, as brigas começam a se estender por vários dias, a voz passa a ser fria e tudo gera discussões. As declarações se esvaem, a vontade de sentar numa cadeira e ver a tarde passar também já não faz diferença, as noites em claro passam a ser motivadas pela dor. O clima pesa e faz tudo ficar cansativo. Sozinhos, começam a sentir-se esquecidos e mal amados, tudo torna-se movido pelo mau humor e as cores do mundo também de vão. Nada mais parece valer a pena e passa-se a sentir saudade; não do outro, exatamente, mas do que ele costumava ser, passa-se a sentir saudade do começo!
As palavras de amor fazem falta, os toques singelos fazem falta, o olhar apaixonado e aquela sensação de abstinência, de não viver mais sem. Aquela pessoa que, há alguns meses atrás, parecia incapaz de te fazer sofrer, passa a falar, pensar e agir exatamente do jeito que te magoa. Parece que ela sabe tudo o que você mais odeia e deixa ali, explicito, pra te sufocar e te fazer enfraquecer. Alguns chegam até a deparar-se com um inimigo, um monstro que, aparentemente, engoliu aquela pessoa que parecia perfeita e inofensiva.
A vida passa a transformar-se num monótono Stand-by, ambos se ligam no piloto automático e deixam tudo como está, tentando manter-se vivos entre uma briga e outra. Acabam-se os planos para o futuro, a ansiedade, acabam-se os “liguei só pra dizer que eu te amo!”. Chegam a durar dias as discussões mudas.
É nessa hora que a maioria dos casais sensatos pensam “Ok, hora de terminar”. Os insensatos? Os insensatos olham para o lado e vêem alguém que, acima de seus defeitos, quer ter pelo resto da vida, alguém que bem lá no fundo, por trás da mascara de mágoa e frieza, ainda é o mesmo pelo qual se apaixonou há tempos atrás. Olham nos olhos e dizem “vale a pena”, e fazem tudo voltar a ser como era no começo. Os insensatos amam, e vão continuar amando, pois já dizia o poeta: amor, é quando você tem todos os motivos pra desistir de alguém, e não desiste.

Nenhum comentário:

Postar um comentário